Iniciei meus estudos de programação há alguns anos. Comecei com ciência da computação primeiro, pra entender como computadores funcionam e depois fui estudar linguagem de programação (Python). Muito divertido, mas mais do que isso. Nessa jornada, percebi que existe uma semelhança entre a criatividade o funcionamento de computadores.

Por isso, de uma forma bem simplificada, me parece que existe uma semelhança entre uma das mecânicas básicas da programação e um dos gatilhos essenciais para a criatividade. Dai esta reflexão.

Por que algumas pessoas tentam ideias novas e outras não?

Um dos princípios e funcionamentos básicos da programação é a lógica de “Se isto, então aquilo”, ou “If this than that”. É o modelo básico que rege como o computador responde quando recebe uma série de comandos (argumentos). Toda a mecânica computacional é baseada nessa lógica matemática.

Na essência: dentro do Word, se eu apertar a tecla ‘A’, isso envia um comando para o aparecer um ‘A’ na tela. Se apertar a tecla ‘B’ uma vez, adicione um ‘B’ à tela.

Isto é uma mega simplificação do conceito, só para fins ilustrativos, para entender mais sobre isso sugiro o Crash course de Computers Science da PBS e o canal do Akita on Rails, começando por vídeo sobre O Computador de Turing e Von Neumann.

Agora vamos lá:

Observe a forma em que nós humanos, pensamos.

Se eu estou com fome (argumento), eu como (comando). Se eu estou com sono, vou dormir. Se eu preciso fazer uma tarefa A, eu uso uma solução A.1. Se eu não sei fazer essa tarefa, eu busco uma solução, ou não faço nada.

Então, podemos super-simplificar o nosso funcionamento de comportamento humano à mesma lógica da programação.

Yuval Harari detalha essa mecânica com excelência em seu livro Homo Deus. Ele faz isso para mostrar que, se o comportamento humano segue uma programação, nós podemos eventualmente programar um computador para entender e replicar um humano. Mas isso é papo para outro artigo.

Diante dessa super-simplificação podemos assumir que o cérebro responde a estímulos internos e externos de acordo com uma programação biológica, resultado de centenas de milhões de anos de evolução dos seres vivos. O seu cérebro e corpo estão programados para responder a certos estímulos de formas pré-programadas (ex: fome) ou de forma criativa (novo problema).

Onde entra a criatividade aqui?

Ao longo de muitos anos trabalhando com criatividade eu desenvolvi uma visão muito pragmática do que é o processo criativo e de como as pessoas interpretam o seu próprio comportamento. É um entendimento sem fundamentos científicos ou técnicos, porém funciona muito bem como uma analogia para entender o gatilho que pode levar ou não ao pensamento criativo.

Partindo do pressuposto que todas as pessoas nascem relativamente parecidas (como o mesmo cérebro e um conjunto de regras básicas comuns a todos), o que difere uma pessoa criativa de uma não criativa, além dos traços de personalidade, é a programação que ela aprende (comandos) para responder aos estímulos (argumentos) que ela recebe, o que resulta em respostas diferentes das normalmente programadas (criatividade).

Considerando que um indivíduo aprendeu a lidar com o mundo através de valores e hábitos transmitidos na escola, da sociedade e dos seus pais, ela passa a interpretar os estímulos e a criar uma série de respostas padrão a cada desses estímulos, que podem ser pensamentos, emoções ou fatos (acontecimentos).

Isso é de se esperar, existe uma pressão social e cultural para se estabelecer respostas padrão para as tarefas. Isso gera padronização e reduz o risco e energia gastos com novas ideias.

É nessa programação que está a diferença: pessoas não criativas diferem das criativas na sua lista de regras, na programação sobre como responder a certos estímulos.

Qual é a essa diferença na “programação criativa”?

Pessoas que não se consideram criativas têm programadas uma lista de regras rígidas para grande parte dos seus cenários “Se isto, então aquilo / If this than That”, enquanto pessoas mais criativas contam com um modelo de regras menos rígido, mais exploratório.

Aqui entro no detalhe, vai ficar meio nerd talk. Vamos ver se consigo explicar de forma simplificada.

Para pessoas menos criativas a regra funcionaria mais ou menos assim:

Imagine uma tarefa A, como preparar o ovo mexido. A Receita A.1 é uma das suas receitas. Você tem um repertório de algumas receitas: A.1, A.2, A.3.
A receita A.1 é uma ordem de mistura de certos ingredientes, em quantidades específicas.

- Para fazer a tarefa A, usar a receita A.1
- Usar esta receita em 100% das vezes.

O interessante é que as não criativas existem apenas duas regras: uma de erro e outra de repetição (loop):

- SE você não sabe fazer tarefa A, não fazer. (tela azul = procrastinação)
- SE a receita A.1 funciona, sempre usar a receita A.1.

Enquanto, pessoas criativas têm uma programação um pouco diferente:

- Para fazer a tarefa A, usar a receita A.1
   - Usar esta receita em 80% das vezes.
   - Em 20 % das vezes ou SE você não sabe a receita A.1:
   - Experimentar nova receita.

Essa pequena diferença, uma abertura (disposição) a testar novas ideias, é o que pode tornar uma pessoa mais criativa. Por que isso leva a:

- Experimentar nova receita para tarefa A:
   - Programação para buscar uma nova solução.
   - Validar o resultado contra o resultado da solução A. (melhor ou pior)
   - SE der certo. Guardar combinação como nova forma de solução para a Tarefa A.
   - SE der errado, tentar novamente N vezes.
   - Depois de N vezes sem sucesso, usar receita A.1.

Isso funciona de forma similar para tarefas novas:

SE você não saber fazer tarefa X, tentar receita de tarefa parecida (Y.1):
- SE Y.1 não funcionar:
   - Tentar receita Y.2.
   - Se Y.2 não funcionar:
     - Tentar nova receita
     - Tentar misturar receitas
     - Tentar N vezes
     - Iniciar programção de buscar ajuda

Uma pequena analogia dessa “Programação mental” que acho muito interessante. A partir dela podemos dizer que, para se tornar mais criativo, é essencial “reprogramar” a sua lista de regras para buscar “receitas” para as tarefas.

Como fazer isso?

Regra 1 – Tentar resolver tarefas de formas diferentes :

Isso pode ser feito através de:

• Elaborar novas receitas
• Misturar receitas antigas
• Reorganizar ordem de execução de uma receita A.1 para a Tarefa A
• Eliminar partes da receita
• Repetir partes da receita

Regra 2 – Entender o problema e desconstruir sua mecânica

Em programação a resolução de um problema parte primeiro da desconstrução do desafio em pequenas partes, para buscar soluções para cada uma dessas partes, em etapas e sequências pré-definidas. Não querendo complicar muito aqui, o que isso significa:

Primeiro é essencial entender quais partes fazer a Tarefa A. Para coisas muito simples esse processo é automático e simples. Para problemas com muitas etapas, essa desconstrução pode ser um pouco mais complexa.

Regra 3 – Testar receitas em um ambiente de testes

Programadores desenvolver seus programas em ambientes de testes, com uma série de etapas até que isso vire “produção”. No processo criativo isso é uma prática muito boa e recomendada.

Devemos “testar” nossas ideias em ambientes de baixo risco, de forma simples e controlada, com baixo risco. Só após isso funcionar com algum grau de confiança é que devemos, podemos, usar essa solução de forma mais ampla.

Os melhores praticantes de Stand-up comedy fazem isso, testando piadas em clubes pequenos ou com seus amigos. Só quando suas piadas funcionam e estão bem azeitadas eles as apresentam ao grande público. Ainda sim, se no grande público ela não funcionar, eles rapidamente eliminam ou ajustam a forma com que contam.

Conclusão:

Então, esse é um pouco do modelo mental que uso para estimular a minha criatividade. Ao me deparar com alguma tarefa, seja ela rotineira ou nova, eu uso uma sequencia de regras que testam e validam novas soluções. Isso quebra a rigidez do pensamento puramente “analítico” e convergente e permite a busca de ideias através do pensamento criativo e divergente.

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Me chamo Patrick Silveira e ajudo empresas a entregar novas soluções para seus clientes através de Estratégia, Inovação e Marketing. Compartilho um pouco da minha experiência e opiniões no meu blog, no Medium, no Instagram e aqui no Linkedin.

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